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  1. A geração de leituras fragmentadas

    terça-feira, 21 de junho de 2016

    Recentemente, a Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, uma iniciativa do Instituto Pró-Livro, divulgou alguns dados sobre os leitores brasileiros. Eles somam 56% da população e leem em média 4,96 livros por ano. Quantas pessoas você conhece que possuem uma paixão enorme pela leitura? Quando falamos de paixão, precisamos levar em conta a subjetividade de cada um. Muitos preferem utilizar o tempo vago empenhando-se em outras atividades que lhe dão prazer e não podemos lutar contra este fato, porém também não se pode negar que os índices da pesquisa são de causar entristecimento se considerarmos o poder enriquecedor de visão de mundo, de conhecimento, de articulação escrita e oral que os livros proporcionam a qualquer leitor disposto a mergulhar nesse universo de múltiplas possibilidades.
    Entretanto, a minha publicação possui um objetivo mais específico: o de questionar o quanto estamos lendo. Pode ser mais do que esperamos se excluirmos os livros e quero deixar claro que absolutamente nada os substitui, mas vale a pena refletirmos um pouco.
    Tal ideia me ocorreu após ler um artigo no qual o autor relata sua dificuldade e desespero por não conseguir mais ler livros, embora sempre tenha sido um leitor assíduo. Ele argumenta que o uso excessivo da internet tem provocado algumas mudanças, dentre elas o rápido cansaço ao pegar um livro e iniciar sua leitura. O mesmo acontece com os livros digitais, prova de que se há um problema, este é mais sério do que estava supondo. A grande questão – eu diria o xeque-mate de toda a história – é a afirmação do autor de que, na verdade, nunca leu tanto como agora. Foi a brecha para eu começar a escrever este texto: o poder normativo da leitura em fragmentos, em doses homeopáticas, está impedindo muita gente de ler livros e grandes artigos, tira a capacidade de concentração rapidamente e gerou um vício em boa parte da população.
    Sai o livro, entra a leitura fragmentada.
    Fonte: ShutterStock.
    O dinamismo virtual nos tornou mais factuais e esta é uma mudança que requer atenção. Por exemplo, no Facebook é comum vermos imagens que trazem alguma frase e posts curtos, o que significa que existe contato com a leitura, porém fragmentada, até visualizarmos outra publicação e repetirmos o processo. Textos como este nem pensar. Esses dias cheguei a ver a publicação de um amigo que não ultrapassava 10 linhas e um comentário: “preguiça de ler tudo isso”. Como é que um livro, nessas circunstâncias, pode ser capaz de prender alguém por muito tempo, e como este alguém pode ser capaz de se envolver com a trama, com os personagens e esperar pacientemente pelo desfecho da história? Difícil, pois parece enrolação. Ou às vezes apenas uma parte específica nos interessa e não temos paciência para o conjunto todo.
    Nós nos tornamos tão factuais e ansiosos que até aquela música que nos dá prazer é afetada por um comportamento pontual. Li um artigo cuja autora menciona um estudo que diz que 25% das músicas do Spotify recebem aquela “skipada”, isto é, são puladas após 5 segundos e que metade dos usuários avança a música antes do seu final. Agora eu pergunto: se não conseguimos ser pacientes nos momentos em que estamos focados naquilo que gostamos de ouvir durante o tempo livre, o que dizer do resto? Já não nos aprofundamos nem naquilo que era para ser fonte de prazer.
    Este é um problema de ordem social e generalizado. É como se nosso cérebro se viciasse na carga pesada de informações e precisasse ser constantemente alimentado por elas. Voltando ao começo, enquanto os livros são dotados de especificidades (enredo fixo, personagens, estilo narrativo), a internet parece mais um parque de diversões com a quantidade imensa de estímulos sonoros e visuais. É bom lembrar que ela é o nosso reflexo, seja bonito ou não de se ver. Talvez o momento seja de mudança e recondicionamento de hábitos. Será que conseguimos?

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